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Atualizado: 16 de jan. de 2024



Sabe quando você gosta tanto de um filme que mal sabe por onde começar? Cá estou tentando concatenar todos os elogios que tenho para fazer sobre Priscilla, o mais novo longa de Sofia Coppola e distribuído aqui no Brasil pela O2 Filmes.

Nessa onda de cinebiografias, Priscilla se destaca por trazer um olhar para além das memórias da protagonista.


Baseado na autobiografia intitulada Elvis e Eu, o longa traz uma história extremamente complexa e cheia nuances problemáticas. Sofia Coppola (Virgens Suicidas, Maria Antonieta, Encontros e Desencontros...) se mostra segura e assertiva na forma com que escolhe retratar sobre a complicada relação Priscilla e Elvis Presley.


Falar sobre a estética fabulosa trazida nos filmes de Sofia até hoje é como escrever sobre o quanto o açúcar é doce ou o sal salgado, esse sempre foi um dos pontos mais fortes da cineasta que mais uma vez traz sua assinatura com seu novo longa.

Cheio de texturas e cenas grandiosas o longa fala sobre feminilidade e o machismo dos anos 60. Tudo na tela está a favor da trama: figurinos completamente Rock Glam; quadros opulentes de uma Priscilla minúscula dentro de sua mansão gigantesca que expressa com destreza sua solidão; o tom esbranquiçado em algumas cenas que trazem a sensação de um registro mais pessoal e luzes e sombras em situações em que nos apresenta Elvis em sua versão mais terrível já exposta até hoje.


A escolha da diretora de não romantizar essa relação é cirúrgica e responsável, afinal estamos falando de um dos maiores astros do rock se relacionando com uma fã de 14 anos, isso é apresentado nos diálogos, a discrepância na maturidade emocional entre os dois, um Elvis manipulador e sem responsabilidade afetiva alguma. O roteiro, assinado pela própria Coppola, também trabalha em paralelo desta problemática, intercalando o romance do casal com cenas da garota ainda na escola, isso traz um desconforto que não passa despercebido.


Outra grande escolha da diretora foi da atriz Cailee Spaeny (Jovens Bruxas) que provavelmente entregou a interpretação da personagem de sua vida. Spaeny capta de forma impactante a essência da protagonista com seus olhares inocentes, mas perfurantes, além de seu tom de voz quase sussurrado que enfatiza toda a submissão em que foi colocada neste relacionamento com o astro. Quem merece destaque também é Jacob Elordi (Saltburn, Euphoria) como Elvis que surpreende como coadjuvante, a química entre os dois é fabulosa. Creio que deve ter sido um grande desafio colocar um dos maiores artistas pop como coadjuvante da história.


Este é o tipo de filme que traz grandes técnicas cinematográficas e se mantém aliado à todos os públicos, de críticos de cinema até espectadores que buscam uma boa história como forma de entretenimento. Isso se prova com o numero expressivo de pessoas que foram ao cinema apreciar o filme desde sua estreia, tanto aqui no Brasil quanto no exterior. Ele traz reflexões importantes sem que entre num lugar didático demais, mas está tudo ali, explícito e sem entrelinhas, sem subtextos.


Priscilla é sem sombra de duvidas uma das maiores obras da carreira de Sofia Coppola lançadas até hoje.

 



Assim que inicia qualquer programa de TV ou estréia algum filme que tem um maior alcance popular logo se iniciam também alguns discursos bem problemáticos quanto à dita  “alienação cultural” ou até mesmo o julgamento do que se é considerado “cultura”.

 

Mais latente do que de costume, esta semana na estréia da sua 24ª Edição do Big Brother Brasil, foi aberta a discussão na internet após um tweet a respeito da dinâmica que definiria quais os últimos participantes entrariam no programa, a postagem dizia exatamente essas palavras “falou que favelado: já ganhou”, pouco mais de 10 minutos depois, após a decisão dos novos participantes (todos com vivências periféricas ou fora dos ditos padrões de beleza), essa mesma pessoa posta: “o ódio que o povo tem das padrão credo”, por incrível que possa parecer, a autora destas frases tão vis é uma ex participante do mesmo reality.

 

Longe de uma analise à fetichização da pobreza ou de minorias, o que de fato tem presença garantida neste reality em específico, ou até mesmo o reforço do famigerado “Pão e Circo”, proponho aqui discutir sobre:

 

O que é cultura?

Quem define o que é e o que não é cultura?

Qual seria o propósito por trás dessa repulsa a cultura e o entretenimento cultural?

 

Na suma literalidade, temos a seguinte definição do que é cultura: “Conjunto das estruturas sociais, religiosas etc., das manifestações intelectuais, artísticas etc., que caracteriza uma sociedade, diferenciando-a de outras: a cultura inca; a cultura helenística.”

 

Repare que o discurso sobre “não gostar de BBB”, vem em sua maioria, recheado de repulsa e não só da vontade de se expressar por não se sentir cativado pelo formato do programa. Essa mesma repulsa vem de forma ainda mais forte quando falamos do que é criado nas periferias: Funk, RAP, Grafite, as Batalhas de Rima ou o Slam (Movimento poético e político criado nos EUA dos anos 80 e que vem se propagando no Brasil desde 2008, por intermédio da artista Roberta Estrela D’Alva).

 

Precisamos então colocar uma lente de aumento sobre quem de fato valida o que é ou não “cultura” pois isso é praticado como forma de impor uma espécie de hierarquia moral que categoriza, distingue e mantém o apartamento social, político e econômico da classe trabalhadora, em especial a periferia.

 

A classe dominante: Que é constituída por homens brancos, heterossexuais e que detém o capital, traz o discurso de ódio as culturas populares como forma de manutenção para manter-se no poder, garantindo também que minorias fiquem longe deste lugar de altivez social, afinal “quem escuta funk e assiste BBB não pode ter um intelecto tão apurado assim a ponto de ser um dito: Detentor da Opinião”.

 

Este texto não tem intenção alguma de forçar pessoas  a gostarem de Big Brother, ou de Funk por exemplo, mas de trazer a oportunidade de uma autocrítica sobre o porque essa repulsa ao dito popular.

 

Será que não estamos apenas repetindo comportamentos e discursos classistas para nos sentir pertencentes à classe dominante ou a um lugar de elite cultural?

 




Quando você pergunta para um cinéfilo qual a melhor época do ano, a chance dele responder que é a temporada de premiações é quase uma certeza. Desde o final da temporada passada, tivemos grandes obras que encantaram espectadores e jures dos maiores festivais ao redor do mundo. Como de costume, vou trazer minhas resenhas sobre os longas mais impactantes que tivemos desde então.


Impossível não começar com o longa-metragem japonês: Monster, dirigido por: Hirokazu Koreeda. QUE PEDRADA!


Colecionando mais de dez prêmios pelos festivais por onde passou, sem sombra de dúvidas esse foi um dos que mais impressionou a crítica e os espectadores, em tantas camadas diferentes. A destreza de Hirokazu de elevar conflitos familiares para um lugar social é para além da linguagem cinematográfica como entretenimento, a forma com que se debruça sobre assuntos tão delicados é cirúrgica, algo único. Essa habilidade enternece em “Pais e Filhos”, 2013 e se confirma em 2018 com “Assunto de Família”.


                Em Monster, a história parte de uma mãe Saori (Sakura Ando) que suspeita da mudança de comportamento de se filho Minato (Soya Kurokawa) que ao indagá-lo acaba contando a ela sobre uma situação de agressão que viveu pelo professor interpretado por (Eita Nagayama). A premissa já traz um certo impacto e deixa a trama extremamente tensionada no primeiro e no segundo ato, num suspense/drama como poucos já produzidos, sem exagero.


O Yuji Sakamoto, quem assina o roteiro, traz a versão da historia em vários pontos de vista: da mãe, dos colegas de sala, do professor, da diretora da escola, menos do protagonista, Minato, tudo numa escolha muito bem escrita e executada que usa um incêndio como ponto de partida de todas essas perspectivas.


Os desdobramentos então, nos entregam com maestria, o subtexto da trama que traz uma critica ferina sobre a desumanização devido a burocracias sociais, a individualidade como escudo, homofobia, bulling, a falta de escuta afetiva e a vulnerabilidade de cada um desses personagens. No meio de tudo isso, temos o espectador o tempo todo tenta juntar as peças, julgando antecipadamente. A genialidade do filme é tão grande que acaba nos colocando como um dos personagens, como monstros também. Mas não ache que por abordar todos estes temas eles não são lidados com profundidade, cada um deles é exprimido impecavelmente.


Aí vem a “pedrada” que citei acima. Temos então a versão do próprio Minato e de seu amigo e colega de sala Eri, interpretado por Hinata Hiiragi, que atua como gente grande emocionando com sua delicadeza e potência, só no último ato, é revelado este olhar dos dois meninos, do mundo paralelo criado por ambos para lidar com as questões pessoais e familiares.


Algumas pessoas compararam Monster com o filme Close, de Lukas Dhont, lançado também em 2023, mas, para além do universo dos dois personagens principais, em ambos os filmes, Monster escolhe se comunicar pelos subtextos ao contrário de Close que tem a comunicação mais imagética. Apesar de haver sim uma semelhança entre os dois, Monster se mostra muito mais cruel, frio num lugar de crítica social enquanto Close deprime o espectador pela trama em si. (Close é incrivelmente belo, logo trago a resenha deste também).


Eu discorreria por páginas e páginas o quanto esse filme quebra paradigmas, desconstrói regras de montagens nos seus recortes e mesmo assim, cheio de técnicas de cinema, se mantém na visceralidade, nada pretensioso, não se perde em momento nenhum e sustenta a critica e a trama mantendo o espectador junto dos personagens o tempo todo.

 
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